Luiz Schwarcz sobre Heloisa Jahn: "Todos hoje choram pela perda da querida editora e amiga"

27/06/2022

Creio que conheci a Helô Jahn no início dos anos oitenta. Ela morava em Brasília e era linda. Na tarde em que a vi pela primeira vez, ela vinha à Brasiliense falar com o meu chefe, Caio Graco Prado. Se não me engano, na ocasião, combinamos publicar uma tradução sua dos poemas eróticos de Paul Verlaine.  

A partir de então Helô não saiu mais da minha vida. Profissionalmente e como amiga. Passou a trabalhar como tradutora e mais tarde como editora na Brasiliense. Antes dela, se não me falha a memória, eu fazia de tudo sozinho nessa área — para ver como o trabalho de edição era precário na época. Maria Emília Bender e Marta Garcia já estavam na equipe, e atuavam paralelamente nas edições, mas a primeira comandava e a segunda, recém-formada, ajudava a criar o primeiro departamento profissional de divulgação de uma editora no Brasil. 

Helô acabou me sucedendo, quando deixei a Brasiliense. Maria Emília tinha aceitado um convite da editora Globo, assim como a Marta, pouco tempo depois. Saímos todos menos a Helô. 

Serão essas três editoras que se juntarão a mim para fundar a Companhia das Letras. Não entraram desde o início, com exceção da Marta que começou bem cedo, mas isso pouco importa. A fundação de uma editora se dá através dos anos, pela repetição de um padrão de qualidade que foi totalmente construído por elas. 

Helô tinha um jeito próprio de trabalhar. Um tipo de caos banhado de doçura, que fazia de cada reunião com ela um conforto, pela voz suave, o pensamento denso e a cumplicidade infinita. Depois que ela saiu da Companhia a editora perdeu em afeto e originalidade. Por sorte mantivemos um contato amigo, e a admiração de sempre.

Seus autores fiéis na Companhia incluíam entre outros Rubem Fonseca, Amyr Klink e Luiz Alfredo Garcia-Roza. Todos hoje comigo, aqui na terra, ou em algum lugar no infinito, choram pela perda da querida editora e amiga.  

E os leitores e leitoras que talvez nem saibam o quanto o trabalho dela os ajudou a ter o melhor de seus autores preferidos, reconhecem que tradutora como ela existem poucas, muito poucas. Doçura e literatura rimam e a Helô teria me corrigido aqui, não me deixaria escrevê-lo, mas ela tristemente não está mais entre nós e quero juntar essas duas palavras, como você fez constantemente na prática. É com elas que quero defini-la, minha querida amiga que hoje se foi.  

Luiz Schwarcz

Luiz Schwarcz é editor da Companhia das Letras e autor de Linguagem de sinais, O ar que me falta, entre outros.

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